Aparecida Nilva dos Santos, Nilvinha, prefeita do Glõria
O Ministério Público Estadual acusou a prefeita Aparecida Nilva dos Santos, a Nilvinha, de ter cometido improbidade administrativa ao tentar passar para a mão de Nilson Marques Costa o matadouro municipal, sem a devida concorrência, já que por este caminho eles, juntamente com Henrique Antônio Lima Marques, se sentiram inseguros, por isso arrumaram um jeito de anular o certame e partir para o convencimento dos vereadores em votar uma lei autorizando que a empresa de Nilson, a Pascal Indústria e Comércio de Carnes Ltda viesse explorar o matadouro municipal. Tudo aconteceu porque a prefeita eleita desejava "saldar" um compromisso de campanha com o empresário, que lhes doou R$3 mil reais para sua primeira campanha eleitoral. Nilvinha foi reeleita em 2016.
A história
Ao analisar as peças do processo a juiza Aline Martins Stoianov Bortoncello, deparou com a pratica de "ato de improbidade administrativa", desdobrando em condutas "com idênticos fim" e adotadas em conluio para "frustrar procedimento licitatório". Atos de improbidade administrativa estão previstos na Lei 8.492/92. artigo 10, inciso VIII.
// (Lei 8.492/92-Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:
VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente; (Redação dada pela Lei nº 13.019, de 2014) )//
A tipificação do que expõe a lei ficou evidente em ações desenvolvidas por Nilvinha, com auxilio de Nilson Marques e Henrique Antonio(tido com conhecedor da administração pública) para fraudar e frustrar "a competitividade do procedimento licitatório, na modalidade concorrência".
A intenção era forjar motivação para revogação da Concorrência 002/2014 e assim convencer os vereadores a editarem lei autorizativa da "concessão direta, sem licitação, para empresa Pascal Indústria e Comércio de Carnes Ltda, de modo favorece-la em detrimento do interessa público na contratação segundo proposta mais vantajosa para a administração", aponta a juíza em sua fundamentação para propalar a sentença.
Era chegada a hora de cuidar de por o matadouro para funcionar, coforme ficou decidido em lei (24/01/2014). Para isso foi elaborado o Edital 02/2014. Empresas interessadas no certame foram à prefeitura e retiram o edital, que previa as condições de concorrência.
Não obstante, o MP diz que já havia entre Nilvinha, Nilson e Henrique um acordo prévio, pelo qual a "prefeita Aparecida Nilva dos Santos e seu doador de campanha Nilson Marques da Costa objetivavam favorecer empresa desse último" , que era a Pascal Indústria e Comércio de Carnes.
Isto quer dizer que embora acontecesse a divulgação do Edital, o " procedimento já tinha destinatário previamente estabelecido" . O que ocorreu, na avaliação do Ministério Público, foi uma "clara afronta ao interesse público", o que configura o ato de "improbidade administrativa" .
Os registros de reuniões e de tomadas de decisões estão registrados em depoimentos, quando se frisa que Nilson Marques era doador de campanha de Nilvinha e que fizera essa doação com a intenção de assumir o comando do matadouro local. O que se depreende de depoimento de Henrique Antonio, que foi chamado para se juntar ao grupo pelo conhecimento que tinha da administração pública.
Com concorrência
Quando souberam que outras empresas tinham a disposição de participar da concorrência, deliberaram pelo "cancelamento da licitação". Para isso, em conjunto, "forjaram a motivação" para cancelar a licitação.
Para que isso acontecesse, embora a prefeita soubesse que o matadouro estava interditado, fez constar do Edital a quantidade mínima de abate de 1200 cabeças/mês.
Mesmo assim algumas empresas se mostraram dispostas a participar da concorrência. Ai o grupo fraudador recorreu ao IMA, quando foi solicitado um parecer para o funcionamento do abatedouro de animais para consumo humano. A resposta era conhecida e do interesse do grupo. Dizia o parecer, solicitado pela empresa Pascal Indústria e Comercio de Carnes: "o local não apresenta condições tecnológicas e estrutural para a realização do abate de 100 animais/dia, conforme consta do teor da solicitação da firma requerente".
Para o MP estava claro a má fé porque solicitaram vistoria para um prédio que estava interditado. E isto eram do conhecimento de Nilson, Henrique e da prefeita Nilva. O depoimento à justiça da fiscal do IMA, Valéria Marise Peixoto, que disse ter sido ela a pessoa que fiscalizou o local. A intenção que lhe foi informada era de por "o prédio velho do Matadouro Municipal" para "funcionar". Valeria diz que se ateve a verificar as benfeitorias do local e não quanto ao tamanho. mas admitiu que uma área de 5.08.18 ha comportaria o matadouro. A questão era capciosa, porque escondia o objetivo da prefeitura adquirir terreno vizinho, com o uso a ser administrado por Nilson.
"Assim, mediante artifício ardil, induziram a produção de um parecer pelo IMA afastado do escopo do processo licitatório, criando um falso motivo para justificar a anulação do certame em andamento e, camuflando essa manobra, induzir os vereadores a erro de modo a convencê-los a autorizar a concessão diretamente, sem licitação", registra a fundamentação da juíza, onde seria baseado a sentença. quando identifica manobras que beneficiariam Nilson, através de sua empresa
A Prefeita pautou-se neste parecer – mesmo sabendo que não guardava consonância à previsão editalícia e à realidade fática – para revogar o procedimento licitatório.
Há mais evidencia de que a intenção era forjar uma motivação para cancelar a licitação. "Dos documentos se afere que o despacho data de 13.02.2014, enquanto que a vistoria (do IMA) apenas ocorreu em 18.02.2014."
Depois disso a Câmara de Vereadores aprovou a lei 1.415/14 autorizando a concessão direta da área do matadouro à Pascal Indústria e Comércio de Carnes Ltda, de propriedade de Nilson Marques. A concessão ainda condicionava a exploração a aquisição de área limítrofe ao Matadouro Municipal, que já era de interesse de Nilson.
São estes os fatos que configurada a pratica de ilicito por Nilson, Nilva e Henrique, "por frustrarem procedimento licitatório", o que caracteriza improbidade administrativa.
A peça preparada pela juíza Aline elenca uma séria de irregularidades e ações que buscam privilegiar os sentenciados, entre eles o argumento de que a exploração do matadouro iria gerar empregos.
Ao fim a sentença condena os envolvidos a devolver dinheiro aos cofres públicos (está sendo calculado) e uma série de restricões. Os acusados podem recorrer (já o fizeram) em outras instâncias.
A sentença
Ao concluir a fundamentação a juíza julga procedentes os pedidos autorais, "nos termos do art. 487, inciso I do Código de Processo Civil, para os fins de declarar a prática do ato de improbidade administrativa previsto no art. 10, inciso VIII da Lei nº. 8.429/92 por Aparecida Nilva dos Santos, Nilson Marques Costa, Henrique Antônio Lima Marques e Pascal Indústria e Comércio de Carnes Ltda, nome fantasia “Pascal” e, nos termos do art. 18 da legislação suso mencionada, determinar a reversão dos bens concedidos à empresa ré ao patrimônio do Município de São João Batista do Glória/MG, caso a medida ainda não tenha sido adotada com a revogação da concessão e, por conseguinte, condená-los às seguintes sanções, considerando o grau de participação na empreitada:
Aparecida Nilva dos Santos:
i) ressarcimento integral do dano a ser apurado em sede de liquidação de sentença;
ii) pagamento de multa civil no importe do valor do dano apurado em liquidação de sentença;
iii) perda da função pública
iv) suspensão dos direitos políticos por 6 (seis) anos; e
v) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócia majoritária, pelo prazo de cinco anos.
Nilson Marques Costa:
i) ressarcimento integral do dano a ser apurado em sede de liquidação de sentença;
ii) pagamento de multa civil no importe do valor do dano apurado em liquidação de sentença;
iii) suspensão dos direitos políticos por 6 (seis) anos; e
iv) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos.
Henrique Antônio Lima Marques:
i) ressarcimento integral do dano a ser apurado em sede de liquidação de sentença;
ii) pagamento de multa civil no importe do valor do dano apurado em liquidação de sentença;
iii) suspensão dos direitos políticos por 6 (seis) anos; e
iv) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos.
Pascal Indústria e Comércio de Carnes Ltda, nome fantasia “Pascal”:
i) ressarcimento integral do dano a ser apurado em sede de liquidação de sentença;
ii) pagamento de multa civil no importe do valor do dano apurado em liquidação de sentença; e
iii) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócia majoritária, pelo prazo de cinco anos.
A sentença foi proferida em 6 de junho de 2019 e há recursos que podem ser feitos em outras instâncias da justoiçã,
Acompanhe a íntegra da sentença
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS
JUSTIÇA DE 1ª INSTÂNCIA
COMARCA DE PASSOS
2ª VARA CÍVEL
Autos nº. : 5000532-11.2016.8.13.0479
Autor : Ministério Público do Estado de Minas Gerais
Réus : Aparecida Nilva dos Santos e outros
S E N T E N Ç A
I – Relatório:
Trata-se de Ação Civil Pública por Ato de Improbidade
Administrativa proposta pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais
em face de Aparecida Nilva dos Santos, Prefeita do Município de São João
Batista do Glória, Nilson Marques Costa, empresário, Henrique Antônio
Lima Marques e Pascal Indústria e Comércio de Carnes Ltda, nome
fantasia “Pascal”, em que se lhes imputa a prática do ato de improbidade
administrativa previsto no art. 10, inciso VIII da Lei nº. 8.429/92, ao
fundamento, em suma, de que os três primeiros réus, em conluio, frustraram e
fraudaram a competitividade do procedimento licitatório na modalidade
Concorrência nº 02/2014, forjando motivação para a sua revogação, bem como
para, posteriormente, convencer os Vereadores a editarem lei autorizativa da
concessão direta do Matadouro Municipal, sem licitação, para a última ré, de
modo a favorecê-la em detrimento do interesse público na contratação segundo
proposta mais vantajosa para a administração.
Junto à inicial foram trazidos documentos.
Devidamente notificados, os réus apresentaram manifestação
por escrito no prazo legal e documentos, acostados ao ID 17949726, 19598757
e 20048969, oportunidade em que arguiram as preliminares.
Manifestação ministerial ao ID 22893531.
Em juízo de prelibação, ao ID 24013161, a inicial foi
devidamente recebida, tendo sido afastadas as preliminares arguidas.
Processo nº. 5000532-11.2016.8.13.0479 1
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Citados, os réus contestaram a demanda aos IDs 25515339,
26441521 e 27043149 ratificando os termos da manifestação por escrito e
pugnando pela improcedência da ação.
Réplica acostada ao feito.
Em sede de especificação de provas, as partes pugnaram pela
produção de prova oral, mediante oitiva de testemunhas.
Durante a instrução do feito, houve a realização de audiência,
sendo ouvidas as testemunhas arroladas.
As partes apresentaram alegações finais.
Vieram-me os autos conclusos para julgamento.
É a síntese do necessário. Decido.
II – Fundamentação:
O feito teve tramitação regular, e embora tenham sido arguidas
preliminares em sede de contestação, verifica-se que estas são idênticas às
arguidas em defesa preliminar e, portanto, já foram enfrentadas na decisão de
recebimento da inicial. Assim, estando o processo em ordem, sem nulidades a
sanar, irregularidades a suprir ou preliminares a enfrentar, passo à análise do
mérito.
Considerando que as imputações realizadas aos réus referem-se
à prática de mesmo ato de improbidade, desdobrado em condutas com idêntico
fim e adotadas em conluio para frustrar procedimento licitatório, farei a
apreciação unificada para melhor explanação dos argumentos quanto ao
arcabouço probatório produzido.
Como detalhado acima, a demanda veicula pedido apresentado
pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais de responsabilização dos
réus por ato de improbidade administrativa previsto no art. 10, inciso VIII da
Lei nº. 8.429/92.
Processo nº. 5000532-11.2016.8.13.0479 2
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Para a tipificação, asseverou o órgão ministerial que restou
apurado nos autos do Inquérito Civil nº. MPMG 0479.15.000036-8 que em
13.02.2014, Aparecida Nilva dos Santos, na qualidade de Prefeita do
Município de São João Batista do Glória, mediante ajuste e com auxílio de
Nilson Marques Costa e Henrique Antônio Lima Marques, fraudaram e
frustraram, juntos, a competitividade do procedimento licitatório, na
modalidade Concorrência, nº. 02/2014, forjando motivação para sua revogação
que posteriormente seria utilizada para convencer os vereadores a editarem lei
autorizativa da concessão direta do matadouro municipal, sem licitação, para a
empresa ré Pascal Indústria e Comércio de Carnes Ltda, de modo a favorecê-la
em detrimento do interesse público na contratação segundo proposta mais
vantajosa para a administração.
Da dinâmica dos fatos decorre que no final do exercício de
2013, o Município de São João Batista do Glória enviou projeto de lei à
Câmara Municipal para fins de autorizar a concessão de uso de bem público, o
Matadouro Municipal, que na ocasião estava desativado, mediante licitação, na
modalidade concorrência, sendo o projeto aprovado e a Lei nº. 1.402/2013
sancionada, com publicação em 18.12.2013, conforme se afere do ID
15993010.
Para dar efetividade ao decidido em lei, em 24.01.2014 foi
instaurado o procedimento licitatório na modalidade concorrência para a
contratação de empresa para delegação do serviço de construção,
implementação e exploração do Matadouro (Frigorífico), sob o regime de
concessão, precedido de obra, em imóvel do Município, conforme se afere do
ID 15993010. O edital nº. 02/2014 foi publicado em 25.01.2014 e 28.01.2014,
sendo que as empresas interessadas no certame solicitaram sua cópia junto ao
departamento responsável nos dias 28 e 29.01.2014, informação comprovada
ao ID 15993077, páginas 14/15.
Não obstante o interesse manifestado por empresas, diz o
Ministério Público que já havia, entre os réus, um acordo prévio, pelo qual a
atual Prefeita Aparecida Nilva dos Santos e seu doador de campanha Nilson
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Marques Costa objetivavam favorecer a empresa deste último, a ré Pascal, no
certame. É dizer, embora divulgado o edital, o procedimento já tinha
destinatário previamente estabelecido, em clara afronta ao interesse público, o
que configura o ato de improbidade administrativa, tal como tipificado na
inicial, sendo estas informações confirmadas de modo detalhado pelo réu
Henrique Antônio de Lima Marques perante o Ministério Público (ID
15993057, páginas 03/04) e corroboradas em juízo, ao ID 50154672, vejamos:
[…] como tem experiência na Administração Pública foi
contratado pela empresa MARQUES COSTA COMÉRCIO
LTDA, como gerente administrativo, tendo como objetivo que
auxiliasse a empresa a obter a concessão de operação do frigorífico
de São João Batista do Glória; que após sua contratação tomou
conhecimento que NILSON MARQUES COSTA, teria feito
doações para a campanha eleitoral da atual Prefeita, a Sra.
APARECIDA NILVA DOS SANTOS; que como forma de
retribuição às doações haveria um acerto entre a Prefeita e
NILSON para que fosse aberta uma filial de uma das empresas
de NILSON em São João Batista do Glória para o abate de
animais; que como representante de NILSON e sua empresa
participou de várias reuniões cujo objetivo era acertar a
melhor forma para que o Município concedesse a operação de
um frigorífico existente na cidade a uma das empresas de
NILSON; que nas reuniões geralmente participavam a Prefeita, a
advogada Dra. CELY, que possui escritório em Piumhi-MG, um
outro advogado do mesmo escritório que não se recorda o nome, o
Sr. NILSON e o depoente; que inicialmente foram feitas
tratativas para que o Município realizasse uma licitação para
concessão de operação do Frigorífico, sendo a licitação
direcionada de forma que a empresa de NILSON vencesse o
certame; que se recorda que a DRA. CELY fez um levantamento
em outros Municípios a fim de saber qual seria a melhor forma de
realizar a licitação; que antes da publicação do edital a DRA.
CELY entregou uma minuta do mesmo ao advogado de NILSON
analisar; que o advogado de NILSON era o DR. DÁCIO LEMOS;
que acredita que o edital do processo licitatório chegou a ser
publicado e depois cancelado pelo Município; que após a DRA.
CELY chegou à conclusão que a melhor forma de “passar” o
frigorífico para NILSON era através de uma cessão real de uso,
com aprovação pela Câmara Municipal; que tal decisão da Dra.
Cely foi motivada no fato de não ter conseguido montar estratégia
que garantisse à empresa Pascal vencer o certame […] (destaquei)
A confissão restou corroborada pelos demais elementos
probatórios contidos nos autos, sendo possível verificar ao ID 15993057,
páginas 06/08 a doação de Nilson Marques Costa à campanha da Prefeita ré no
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valor de R$ 3.000,00, sendo o favorecimento no certame licitatório a
retribuição prestada.
Outrossim, comprovou-se ainda que os réus, de conhecimento
da existência de outros interessados na licitação, e receosos de que a
empreitada ilícita pudesse não se efetivar, deliberaram pelo cancelamento da
licitação, estabelecendo que a concessão do matadouro municipal à empresa ré
se daria de modo direto. Para tanto, em unidade de desígnio, Aparecida Nilva
dos Santos e Nilson Marques Costa, com o auxílio de Henrique Antônio Lima
Marques, forjaram a motivação do cancelamento da licitação, sendo que esta
mesma motivação justificaria o pedido ao Poder Legislativo de autorização
para que a concessão se desse de forma direta, sem licitação, em benefício da
Pascal Indústria e Comércio de Carnes Ltda, nome fantasia “Pascal”.
E a trama se comprova pelas provas constantes dos autos, uma
vez que, embora Aparecida Nilva soubesse das condições de instalação do
matadouro municipal que estava interditado e que sua estrutura não
comportaria adaptações e nem mesmo ampliação para fins de funcionamento
na escala licitada, fez constar no edital como objeto, ao item 2.1.2 que o
matadouro deveria comportar, como quantidade mínima para execução dos
serviços de abate de animais bovinos e suínos, 1.200 unidades por mês.
Contudo, verificando que ainda com este objeto algumas
empresas manifestaram interesse em participar do certame, os réus, em
concurso, tramaram a solicitação vistoria do IMA – Instituto Mineiro de
Agropecuária na edificação e benfeitorias do Matadouro para obter
manifestação formal sobre a adequação da estrutura existente para o
funcionamento e, com fundamento no relatório do IMA, que já previam a
resposta, a Prefeita anularia a concorrência e proporia novo projeto de lei,
visando a concessão direta do imóvel rural e respectivas benfeitorias à empresa
Pascal.
Ao ID 15993044, página 05, consta ofício expedido pelo IMA à
empresa ré, dirigido ao representante e corréu Henrique Antônio Lima
Marques, no qual assevera:
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Acusamos recebimento da solicitação da empresa PASCAL
INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE CARNES LTDA, e nos
dirigimos até o imóvel onde está instalado o prédio do Matadouro
Municipal de São João Batista do Glória, após vistoria in loco, o
local não apresenta condições tecnológicas e estrutural para a
realização do abate de 100 animais / dia , conforme consta do
teor da solicitação da firma requerente, sendo também inviável
o processo de reforma para ampliação para atender a demanda do
abate solicitado pela empresa. (destaquei)
Ora, estranhamente, e em clara concretização da empreitada
ilícita, os réus solicitaram a avaliação para abate de 100 animais por dia (ID
15993077, página 19), enquanto que no edital do certame o objeto previa 1.200
animais por mês. Outrossim, em clara má-fé, a vistoria foi solicitada no prédio
do matadouro municipal que, conforme era de conhecimento dos réus, estava
interditado, sem condições de funcionamento, sem que se considerasse a área
remanescente do imóvel público, a fim de verificar se comportava as novas
instalações. O fato é corroborado pela fiscal do IMA Valéria Marise Peixoto,
em suas declarações prestadas ao órgão ministerial ao ID 15993077 e
confirmadas em juízo, vejamos:
[…] A declarante esclareceu que realmente fez vistoria in loco
no “prédio velho do Matadouro Municipal”, pois a intenção do
requerente era “por aquilo ali pra funcionar”. […] a vistoria foi
feita no sentido de averiguar se as benfeitorias do Matadouro
Municipal atendiam a legislação vigente ou não, sendo certo que
foi constatado que não atendiam, isso porque não se adequavam às
especificações técnicas quanto ao abate de animais […] a
declarante esclareceu que seu parecer se limitou na verificação
das benfeitorias existentes no local, não quanto ao tamanho do
imóvel rural em que se encontravam, pois sequer conhece o
tamanho da propriedade. Perguntada se um imóvel/terreno
com 05.08.18ha comportaria o matadouro municipal, no
tamanho pretendido pela empresa Pascal, a declarante disse
que sim, pois é área suficiente para implantar todas as
benfeitorias necessárias para aprovação. (destaquei)
Desse modo, é notório que pela trama empregada pelos réus, a
vistoria se deu de forma totalmente divorciada da realidade, uma vez que não
considerou a real a quantidade de animais que se pretendia abater, conforme
previsão editalícia, bem como se deu com vistas a reativar a estrutura existente
para abate, enquanto que a pretensão administrativa era a construção de nova
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estrutura do frigorífico, na área remanescente do imóvel, que ao final da
concessão, seria revertida em favor do Município.
Assim, mediante artifício ardil, induziram a produção de um
parecer pelo IMA afastado do escopo do processo licitatório, criando um falso
motivo para justificar a anulação do certame em andamento e, camuflando essa
manobra, induzir os vereadores a erro de modo a convencê-los a autorizar a
concessão diretamente, sem licitação, à empresa ré.
Conforme previamente pactuado, a Prefeita pautou-se neste
parecer – mesmo sabendo que não guardava consonância à previsão editalícia e
à realidade fática – para revogar o procedimento licitatório, conforme se afere
do despacho contido ao ID 15993044, página 4, em que diz:
[…] CONSIDERANDO as recomendações do Instituto
Mineiro de Agropecuária, atestando a impossibilidade de
instalação naquele local, de matadouro municipal para abate
de 100 animais/dia, bem como a inviabilidade do processo de
reforma para ampliação;
CONSIDERANDO a impossibilidade de futuro vencedor da
licitação dar cumprimento ao contrato a ser firmado; […]
(destaquei)
Não fosse o bastante, evidencia ainda mais o agir deliberado dos
réus para usurpação da coisa pública o fato de que a vistoria realizada pelo
IMA que motivou o despacho da Prefeita pela revogação do edital de licitação
ocorreu cinco dias antes da elaboração deste. Dos documentos se afere que o
despacho data de 13.02.2014, enquanto que a vistoria apenas ocorreu em
18.02.2014, conforme termo de nº. 039073, acostado ao ID 15993077, página
17. Assim, é forçoso reconhecer que em concurso, os réus solicitaram a vistoria
já sabendo de seu resultado, posto que a solicitaram a para parâmetros
impossíveis de serem concretizados na estrutura do matadouro municipal e,
assim, valeram-se deste para conferir formalidade à prática ilícita.
Em continuidade à empreitada, foi aprovada pela Câmara
Municipal de São João Batista do Glória a Lei nº. 1.415/14, acostada ao ID
15993044 e 15993053, autorizando a concessão direta da área do matadouro
municipal à ré Pascal Indústria e Comércio de Carnes Ltda e condicionando a
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concessão à aquisição do terreno anexo – área que já era de interesse do réu
Nilson –, revogando a Lei nº. 1.402/13 que previa a modalidade de
concorrência para a concessão de uso, dispensando-a ao fundamento de estar
amparado no atendimento ao interesse público, enquanto que, na realidade,
valia-se a Prefeita de bem público para favorecer interesses particulares, em
clara recompensa à doação de campanha recebida.
Portanto, não merece prosperar as alegações trazidas pela defesa
da Prefeita, de que seu ato não configura improbidade administrativa por estar
amparado na lei municipal e, portanto, dotado de legalidade. Ora, dos autos
restou demonstrado à profusão que a lei em que se pautou a ré para revogar o
certame licitatório foi por ela mesma proposta e, restou aprovada pela Câmara
Municipal em virtude de os Vereadores terem sido induzidos a erro com a
apresentação de relatório pautado em dados que não se coadunam à realidade.
Dessa forma, em síntese, restou comprovado no feito que os
réus, cada um em sua esfera de atuação, mas com desígnio único de favorecer a
empresa Pascal na concessão de uso do matadouro municipal, foram
responsáveis pela revogação do edital de concessão nº. 02/2014 pela ré
Aparecida Nilva que, em sequência, apresentou novo projeto de lei nº. 05/2014
ao Poder Legislativo, ao argumento de que a área do Município não
comportava o abatedouro, pois não apresentava condições tecnológicas e
estrutural para atender às demandas, sendo inviável o processo de reforma,
somado ao fato de que a ré Pascal tinha interesse em adquirir a área ao lado, de
modo a viabilizar a instalação e, como resultado dos esforços, almejaram a
sanção e publicação da Lei nº. 1.415/14, que autorizou a concessão direta,
havendo a assinatura da escritura pública e concessão da área.
Pelos fatos, resta configurada a prática de ato ilícito praticado
pelos réus, por frustrarem procedimento licitatório, previsto no art. 10, inciso
VIII da Lei nº. 8.429/92, que diz:
Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa
lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que
enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou
Processo nº. 5000532-11.2016.8.13.0479 8
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dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º
desta lei, e notadamente:
[...]
VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo
seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins
lucrativos, ou dispensá-los indevidamente; (Redação dada pela
Lei nº 13.019, de 2014) (destaquei)
[…]
Acerca da conduta de frustrar a licitude de processo licitatório,
Adriano Andrade, Cléber Masson e Landolfo Andrade, na obra Interesses
Difusos e Coletivos, vol. 1, 9. ed., Rio de Janeiro: Forense; São Paulo:
MÉTODO, 2019, p. 847, asseveram:
Frustrar a licitude de processo licitatório significa descumprir as
normas e os princípios da licitação, de forma a restringir,
comprometer ou mesmo eliminar o seu caráter competitivo, em
prejuízo real da igualdade entre os concorrentes e da seleção da
proposta mais vantajosa para a Administração Pública.
Dessarte, tratando-se de ato de improbidade consubstanciado na
conduta de frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo
indevidamente, presume-se o dano ao erário, uma vez que apenas o
procedimento dotado de publicidade poderá garantir a participação de
múltiplos interessados e, assim, permitir que o Poder Público possa escolher
dentre as propostas apresentadas, a que melhor atende ao interesse público.
Neste sentido, vejamos:
EMENTA: APELAÇÃO. REEXAME NECESSÁRIO
CONHECIDO DE OFÍCIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO
DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DISPENSA
IRREGULAR DE LICITAÇÃO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
DE IMPLANTAÇÃO DE REDE COLETORA DE ÁGUA
PLUVIAL. DANO AO ERÁRIO PRESUMIDO. DANO "IN RE
IPSA". PRECEDENTES DO STJ. NECESSIDADE DA
COMPROVAÇÃO, PELO AUTOR, DO DOLO OU DE CULPA.
COMPROVAÇÃO DO ELEMENTO SUBJETIVO: DOLO
GENÉRICO. CARACTERIZAÇÃO DA IMPROBIDADE.
RESSARCIMENTO. SENTENÇA REFORMADA. - Os atos de
improbidade previstos nos artigos 9º, 10 e 11 da Lei nº 8.429/92
exigem a presença do elemento subjetivo, qual seja, o dolo ou
culpa do agente, a depender da hipótese do enquadramento, não se
revelando suficiente a mera comprovação de dano ao erário. - A
dispensa de licitação fora das hipóteses legais previstas no
artigo 24 da Lei 8.666/93 é tipificada no artigo 10, VIII, da LIA
como ato de improbidade administrativa. - O entendimento
pacífico do STJ é no sentido de que "a indevida dispensa de
licitação, por impedir que a administração pública contrate a
Processo nº. 5000532-11.2016.8.13.0479 9
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melhor proposta, causa dano "in re ipsa", descabendo exigir
do autor da ação civil pública prova a respeito do tema" (STJ,
REsp 817.921/SP, Rel. Ministro CASTRO MEIRA,
SEGUNDA TURMA, DJe de 06/12/2012). - Na esteira da
jurisprudência do colendo STJ, basta a presença de dolo genérico
ou "lato sensu" para configurar improbidade administrativa, ou
seja, a simples inobservância dos ditames constitucionais e/ou
legais quando da gestão de recursos públicos. - Presentes tanto o
prejuízo ao erário por ato do agente público, quanto o elemento
subjetivo, deve-se reformar a r. sentença que julgou improcedentes
os pedidos iniciais. - Em se tratando de agente público que exerce
mandato, o prazo prescricional de 5 anos se inicia com o término
do exercício do mandato, e, nos casos de reeleição, o prazo
somente tem início após o término do segundo mandato. - Por sua
vez, o prazo prescricional para as ações de improbidade
administrativa é, em regra, de cinco anos, ressalvando-se a
imprescritibilidade da pretensão de ressarcimento ao erário.
Precedentes do STJ. - As demais sanções estão prescritas. -
Sentença reformada, em reexame necessário, prejudicado o recurso
voluntário. (TJMG - Apelação Cível 1.0701.11.023869-1/001,
Relator(a): Des.(a) Wander Marotta , 5ª CÂMARA CÍVEL,
julgamento em 13/09/2018, publicação da súmula em 19/09/2018)
(destaquei)
Não fosse o bastante a configurar o ato e ensejar a punição dos
agentes, o erário restou ainda lesado em outros aspectos. Isso porque, o edital
de licitação previa como objeto a concessão, dentro dos limites do território do
Município de São João Batista do Glória, do serviço público de abate de
animais bovinos e suínos destinados ao consumo humano, pelo período de 25
anos, precedida de obra para instalação do objeto da concessão,
consubstanciada na construção do prédio e implantação das instalações
necessárias para prestação dos serviços em imóvel pertencente ao Município,
conforme se afere dos itens 2.1 a 2.3 do edital.
Por sua vez, revogado e realizada a concessão direta, esta exigiu
tão somente a edificação/adequação construtiva do imóvel, para que sirva de
suporte para a implantação do abatedouro/frigorífico, sendo obrigada a adquirir
uma área de terras anexa ao imóvel concedido. Desse modo, como bem
salientado pelo Ministério Público, as obras que antes seriam arcadas pelo
vencedor e construídas no imóvel do Município, para posterior encampação ao
término do período de concessão, de modo a remunerar o ente político pela
Processo nº. 5000532-11.2016.8.13.0479 10
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concessão do imóvel, passaram a ser construídas no imóvel adquirido pelo
particular, nada acrescentando ao erário.
Ademais, a empresa beneficiada foi obrigada apenas a fazer
adequações nas instalações do matadouro municipal, para que este servisse tão
somente de suporte ao empreendimento instalado no imóvel particular. Assim,
todas aquelas obras detalhadas no item 2.1.2 do edital deixaram de serem feitas
no imóvel Municipal. Não fosse o bastante, a concessão direta se deu sem
análise e vinculação a plano de trabalho, bem como não estipulou o número
mínimo de abates a ser realizado como feito no edital licitatório.
Portanto, sobejamente demonstrado o prejuízo causado ao erário
pela conduta dos réus de frustrar o procedimento licitatório para a concessão de
uso do matadouro do Município de São João Batista do Glória, posto que este
procedimento já se destina à garantia do interesse público. Neste sentido,
vejamos importante lição doutrinária, acerca do procedimento licitatório e seus
dispositivos regentes:
No Direito brasileiro, a licitação constitui regra fundamental para
contratação em geral pela Administração Pública, sendo a dispensa
a exceção, conforme dispõem o art. 37, XXI, da CF e o art. 2º da
Lei 8.666/1993.
A licitação destina-se a garantir a observância do princípio
constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais
vantajosa para a Administração e a promoção do
desenvolvimento nacional sustentável. A dicção do art. 3º da
Lei 8.666/1993 estabelece como princípios básicos do
procedimento licitatório a legalidade, a impessoalidade, a
moralidade, a igualdade, a publicidade, a probidade
administrativa, a vinculação ao instrumento convocatório e o
julgamento objetivo. (Adriano Andrade, Cléber Masson e
Landolfo Andrade, na obra Interesses Difusos e Coletivos, vol. 1,
9. ed., Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2019, p.
847) (destaquei)
Outrossim, é válido salientar que embora os réus pautem seus
argumentos no fundamento de que a Prefeita somente buscava atingir o
interesse público com a geração de empregos e ativação do matadouro
municipal que estava interditado, é de se ver que o procedimento licitatório, de
previsão constitucional, se presta justamente a garantir que os entes públicos
contratem as melhores propostas, sendo que por meio deste seria possível
Processo nº. 5000532-11.2016.8.13.0479 11
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alcançar a mesma finalidade, claro que, não sendo garantido que fossem
privilegiados aqueles escolhidos pela Prefeita ré ante a impessoalidade regente.
Assim, embora louvável a preocupação com a facilitação do
abate dos animais pelos pecuaristas locais, que precisam se dirigir a outros
municípios da região para isso, bem como com o fato de que o novo frigorífico
geraria empregos à população, a gestão da res publica exige procedimentos
próprios a serem seguidos, justamente a fim de que também a população que
elege seus representantes tenha ciência das condutas por eles adotadas, não se
admitindo que o gestor, a seu bel prazer, opte por seguir intuições próprias e
afaste-se do teor legal, mormente porque sabe-se que a eles não é dado apenas
fazer o que a lei manda, mas também apenas deixar de fazer o que a lei
autoriza.
Portanto, restou demonstrada a existência do dolo, mediante o
agir concatenado dos réus, cada um dentro de suas atribuições habituais, para
que restasse frustrado o procedimento licitatório e a empresa ré fosse
beneficiada com a concessão. Saliente-se que para a configuração do ilícito a
lei apenas exige o dolo genérico, a vontade de praticar a conduta objetivamente
proibida pela ordem jurídica, independente da existência de finalidade especial.
Neste sentido, vejamos o pensamento de Hugo Nigro Mazzilli:
O dolo que se exige é o comum, a vontade genérica de fazer o que
a lei veda, ou não fazer o que a lei manda. Não seria preciso que o
administrador violasse um concurso ou uma licitação por motivos
especiais (como para contratar parentes ou beneficiar amigos).
(A defesa interesses difusos em juízo. 14. ed. São Paulo: Saraiva,
2002. p. 200).
Neste ponto reside o ato ilícito, uma vez que o fundamento
utilizado para afastar a obrigatoriedade da licitação foi ilegítimo, divorciado da
realidade e, portanto, deve ser não somente invalidado o ato, mas aplicada a
sanção àqueles que intentaram sua prática, mormente porque, in casu, restaram
demonstrados os demais requisitos, uma vez que constata-se que a conduta
adotada pelos réus ensejou o prejuízo ao erário, conforme descrito à exaustão
acima.
Processo nº. 5000532-11.2016.8.13.0479 12
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Por fim, saliente-se que a anulação da concessão pela ré em nada
prejudica a aplicação da sanção no presente feito, posto que esta apenas se deu
após a recomendação ministerial, ou seja, após o momento em que os fatos
tornaram-se conhecidos pelo Ministério Público e passaram a ser apurados. É
dizer, muito provavelmente, se não houvesse intervenção ministerial a tempo e
modo, a concessão ainda estaria vigente, prolongando seus efeitos nefastos.
Outrossim, quando revogada a concessão, o ato já havia provocado repercussão
no erário do município, é dizer, já haviam sido causados os prejuízos, de modo
que dito argumento não é hábil a afastar a imposição sancionatória.
Desse modo, a procedência da demanda é medida indesviável.
III – Dispositivo:
Por todo o exposto e pelo que mais dos autos consta, JULGO
PROCEDENTES os pedidos autorais, nos termos do art. 487, inciso I do
Código de Processo Civil, para os fins de declarar a prática do ato de
improbidade administrativa previsto no art. 10, inciso VIII da Lei nº. 8.429/92
por Aparecida Nilva dos Santos, Nilson Marques Costa, Henrique Antônio
Lima Marques e Pascal Indústria e Comércio de Carnes Ltda, nome fantasia
“Pascal” e, nos termos do art. 18 da legislação suso mencionada, determinar a
reversão dos bens concedidos à empresa ré ao patrimônio do Município de São
João Batista do Glória/MG, caso a medida ainda não tenha sido adotada com a
revogação da concessão e, por conseguinte, condená-los às seguintes sanções,
considerando o grau de participação na empreitada:
Aparecida Nilva dos Santos:
i) ressarcimento integral do dano a ser apurado em sede de
liquidação de sentença;
ii) pagamento de multa civil no importe do valor do dano
apurado em liquidação de sentença;
iii) perda da função pública;
Processo nº. 5000532-11.2016.8.13.0479 13
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iv) suspensão dos direitos políticos por 6 (seis) anos; e
v) proibição de contratar com o Poder Público ou receber
benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda
que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócia majoritária, pelo prazo
de cinco anos.
Nilson Marques Costa:
i) ressarcimento integral do dano a ser apurado em sede de
liquidação de sentença;
ii) pagamento de multa civil no importe do valor do dano
apurado em liquidação de sentença;
iii) suspensão dos direitos políticos por 6 (seis) anos; e
iv) proibição de contratar com o Poder Público ou receber
benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda
que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo
de cinco anos.
Henrique Antônio Lima Marques:
i) ressarcimento integral do dano a ser apurado em sede de
liquidação de sentença;
ii) pagamento de multa civil no importe do valor do dano
apurado em liquidação de sentença;
iii) suspensão dos direitos políticos por 6 (seis) anos; e
iv) proibição de contratar com o Poder Público ou receber
benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda
que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo
de cinco anos.
Pascal Indústria e Comércio de Carnes Ltda, nome fantasia
“Pascal”:
i) ressarcimento integral do dano a ser apurado em sede de
liquidação de sentença;
Processo nº. 5000532-11.2016.8.13.0479 14
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2ª VARA CÍVEL
ii) pagamento de multa civil no importe do valor do dano
apurado em liquidação de sentença; e
iii) proibição de contratar com o Poder Público ou receber
benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda
que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócia majoritária, pelo prazo
de cinco anos.
Condeno ainda os réus ao pagamento das custas processuais.
Após o trânsito em julgado, remetam-se os autos ao contador do
juízo para os cálculos das custas, intimando-se os réus a prestá-las em 15
(quinze) dias. Decorrido o prazo sem pagamento, expeça-se certidão de não
pagamento de despesas processuais.
Ato contínuo, tornem os autos conclusos para inserção das
condenações nos sistemas informatizados cabíveis.
P. R. I. C.
Passos, 06 de junho de 2019.
Aline Martins Stoianov Bortoncello
Juíza de Direito