Sem enxergar, menino joga capoeira e luta jiu-jítsu
Sentir a vida além do que os olhos permitem. Aceitar que, com força de vontade, tudo é possível de se concretizar. Esses são só alguns dos lemas de vida do pequeno francano Victor Hugo Souza Silva. Aos 11 anos, e sem enxergar nada, o garoto comprova que não há limites para quem quer conquistar o que sonha. E o que ele que deseja? Ser professor de capoeira e mestre em jiu-jítsu. E para isso ele já luta as duas modalidades esportivas.
A história de superação de Victor começou ainda bebê, quando ele tinha seis meses. Sua mãe, Eliana Aparecida de Souza, 35, descobriu, em um exame de rotina, que Victor tinha manchas escuras nas duas córneas. Um laudo médico diagnosticou que o garoto tinha tumor nos olhos. Victor passou por uma série de tratamentos (quimioterapia e radioterapia) e o problema de saúde não foi revertido. Os médicos aconselharam a retirada dos olhos para o uso contínuo de uma prótese ocular. “Com 1 ano ele perdeu um olho. Com um 1 ano e 2 meses perdeu o outro” Eliana diz que na época que descobriu o câncer no filho, ela pensou em doar um dos olhos. “Como eu já tinha conhecido o mundo, eu quis dar um dos meus olhos para ele também ter a chance de enxergar a vida e eu continuar com uma visão para cuidar dele. Mas, não foi possível, porque o risco de rejeição era muito grande. Na hora eu entrei em pânico. Chorei muito.” Os especialistas atestaram que Victor nunca enxergou.
E o que parecia ser o fim foi o começo de uma linda lição de vida. “Deus foi tão grande que me surpreendeu. Victor Hugo não me deu trabalho. Ele pensa que todos são como ele”, diz, emocionada, a mãe que costura sapatos em casa.
Victor está no 6º ano, na Escola Estadual “Professora Helena Cury de Tacca”, no Jardim Tropical - mesmo bairro em que mora com a mãe. Ele é o único deficiente visual da escola. Ele é auxiliado pelos amigos que fazem um rodízio para acompanhá-lo. Após os estudos, ele tem três horas livres para brincar e fazer o que deseja. “A minha rotina é normal, como de qualquer outra criança. Não muda nada. Tudo que as outras crianças fazem, eu faço também”, diz Victor, que ainda anda de bicicleta, skate e joga futebol. Após este horário, ele faz aulas de reforço com uma professora que ensina Braille, em uma máquina doada pela Prefeitura de Franca. Neste período, ele aprende a transcrever tudo que foi ensinado pela manhã. Para a aprendizagem, ele também conta com um notebook com comando de voz. Depois, Victor volta para casa, lancha e, na sequência, inicia os treinos de capoeira e jiu-jítsu.
Capoeira
O educador físico Wescley Gimenez Silva, 36, é professor de capoeira no Grupo Cativeiro Capoeira de Franca e mestre faixa preta em jiu-jítsu. Ele atua no ramo há 10 anos. Morador também no Jardim Tropical, Gimenez começou a observar o garoto de longe, sentado na calçada, prestando atenção aos toques do berimbau que vinham do vizinho. “Ele pediu para conhecer o instrumento e gostou. Na época eu não tinha academia e estava em tratamento, me recuperando de lesões. Prometi a ele que se eu voltasse a dar aulas, seria o professor dele na capoeira e no jiu-jítsu.” Gimenez se recuperou, conseguiu montar uma academia no bairro, a Ginásio Alfa, e deu a oportunidade ao garoto.
“No esporte não existe ‘não consigo’, ‘não posso’. Mesmo que tenha deficiências, o esporte sempre encontra um meio”, disse o educador. Segundo Gimenez, os treinos de Victor são sensoriais, orientados de modo linguístico e nos movimentos mais complexos de forma cinestésica (relativa às sensações do corpo). Victor treina há mais de um ano, jiu-jítsu, capoeira e musculação. Além de lutar, toca berimbau, agogô e pandeiro. “Ele é a inspiração de todos da academia. A equipe treina motivada e tem participação no aprendizado dele”, disse Gimenez.
Victor diz que não existe dificuldade para ele. “A deficiência visual não me atrapalha em nada.” O garoto diz que percebe que as pessoas se sentem surpresas pelo fato dele levar uma rotina normal, incluindo a prática de atividades físicas e os instrumentos. “Imagino que as pessoas não acreditam que eu consigo. Mas, se eu posso, todos podem. Tem que ter apoio, tentar e insistir.”
Em outubro, Victor participará do seu primeiro campeonato. Ele está inscrito para participar da 1ª Copa Jiu-Jítsu, em Ribeirão Corrente. O evento acontece dia 22 de outubro, no Ginásio Poliesportivo da cidade.
Para a ocasião, ele sonha em ganhar, além da medalha de ouro que almeja, um novo quimono para receber a sonhada conquista em grande estilo. “Fico muito feliz. Confesso que eu não acreditava. E hoje, acredito que meu filho pode ir muito além do que eu imagino”, diz a mãe do garoto. “Hoje não tenho medo de mais nada. O Victor é muito bem acolhido em todos os lugares em que ele chega. Creio que no futuro promissor que o aguarda não será diferente.”
Fonte:gcn.net
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